segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Aqui, pequena, na vida que se finda
ferida rasgada 
tinto sangue
guarda o meu olhar, verde de mar

sangue que corre.
Luz. Um mar que morre.
Guarda o meu olhar, verde de mar.
Ao longe 

o mar 
gélidas tempestades
o grito anil das andorinhas que partem
levam-me deste pesadelo.

Cessarei na dor. Perderei o pôr do sol.


BRUMAS

Perco o rumo num caminho de trevas 
onde a tua rutilante Luz não vence a escuridão.
Definho.

Teço as horas, devagar. Retorno aos fios do passado na esperança, 
vã 
de cerzir o que se rasgou.
Leio o fio das palavras mas nada se concerta. O Tempo não parou. 
Espero, Penélope paciente, o regresso do eterno amado. 
Perco tudo. Estou velha e gasta. 
O tempo esfuma-se. Eu conto-o, paciente.
Recolhida no Inverno que se eterniza, espero até à morte
sem Argus que me acompanhe ou deuses que me norteiem. 
Abraça-me o frio e espesso nevoeiro que me traz notícias da morte... estou na fila. 
Definho... Ausente o teu doce afecto na solidão agonizante.


sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Houve outrora um Tempo
sem tempo em que corremos, 
abraçamos felizes as estrelas
e delas enchi as mãos e o coração.
Outrora fui estrela, pulsante, refulgente 
lembras-te?

Dois aguçados gumes trespassam agora a minha alma
grito de dor e atravessam-me, vagarosamente, neste tempo com tempo
grito
grito
grito
e tu não me escutas.

Segredas-me que outrora,
na alvorada das estrelas,
corremos muito longe, olhos fechados.
Vivíamos e amávamos, olhos nos olhos,
longe, longe, 
sem tempo.
Mas não escutas já 
o bramido da minha dor. 
Olvidaste-me no lastro remoto do Tempo.

Outrora num Tempo sem tempo, 
não cerrada ainda neste excruciante corpo,
voei translúcida, sem asas e sem medo.
Memórias cristalinas
longe, longe.

Sem energia, sem rasgo e vigor
sem sombra sequer, rastejo
grito 
grito
grito
a lancinante
dor que me atravessa e rasga
submersa no caos e na lodacenta escuridão da noite.
Outrora fui estrela e corri sem medo.
Outrora sabias de mim. 

Outrora num tempo sem sonho,
livre, alva e sem dor, Amei.
Na dor abandono-me e entre lágrimas confundo-te,
livre, fulgurante e dançando diante de mim
há muito tempo, tanto tempo
longe.

Silencio-me na dor.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

CAOS











Caos, caos,
em demanda por actos e palavras do futuro. 
Não, não existo neste corpo! Neste corpo não voo nas asas dos pássaros invisíveis. 
E partiram já as aves de mil cores, salpicadas de estrelas, 
tão longe, para tão longe. 
Jamais lhes chegarei na forma atroz e pesada que me limita e encerra.

Caos e escuridão. Distante a luminosidade que outrora transbordou no meu coração.
Caos, porque ontem, outrora num passado-futuro, fui capaz de abraçar o Universo.

E partem os pássaros! 

Partem e com eles levam as asas de mil cores... 
esqueceram-se de mim!

Talvez 

possa partir nas asas do Tempo 
atravessar as altas florestas de sonho, 
Sagrado Tempo que vem
e escuto a canção de ir, deixo-me ir, 
deixo-me ir... 
No infinito esqueço o corpo, abandono o lastro da memória.
No caminho, a cada passo, a liberdade.
Um dia houve, sim, que corri 

e em campos abertos, longínquos, estendi as asas e parti.
Abracei-te na Luz, sem medo de partir.

Olho para trás, os meus passos esqueceram-se das Estrelas.


(Sentir e Ser - 2013)

quinta-feira, 25 de julho de 2013

FLORESTAS DE INFÂNCIA
















Por tua causa,
sabem a Maio os morangos
e o Verão guardou o Sol em sumarentas ameixas quentes,
colhidas em incautos gestos.

Por tua causa,
trepei pelo espírito da Árvore
e aninhei-me em seus braços,
acolhi as flores e provei os frutos
de todas as Estações e Tempos.

Por tua causa
fui Ente diáfano de todas essas Flores,
de todas essas Árvores,
inspirei e guardei perfumes exóticos
de jasmim, canela e rosa.

Por tua causa
segredaram-me ao ouvido
os seus indizíveis nomes,
as coisas que outrora povoaram esses lugares.

Por tua causa,
coube,
inteira,
a minha colossal e frondosa floresta,
no teu pequeno quintal!

Lá pertencemos e vivemos!

(Sentir e Ser - 2013)

quarta-feira, 24 de julho de 2013

PORQUE HOUVE UM TEMPO















Houve um dia em que corremos,
montes e vales adentro.
De mãos dadas corremos
e perseguimos,
flores e borboletas.
Alcançámos as estrelas, lembras-te?

Houve um dia em que corremos
e abraçámos o universo, a Luz do crepúsculo antes da Aurora.
Houve um tempo em que amámos.

Poderei esquecer que te abarquei
na grandeza deste enlace.
Livre, danço e corro.

Olha!
Livre, como sou livre e danço e corro!
Fluo.

Escuta,
persigo um tempo que houve, um tempo que oiço,
ecos de um tempo,
porque houve um tempo que virá.

Morro-me num tempo
que não me detém na infinitude.

(Sentir e Ser - 2013)

TRANSLÚCIDO







Junto às águas murmurantes
respira ténue a brisa do crepúsculo.
Salgueiros e carvalhos sussurram
na anciã linguagem de folhas e água.
Transitam memórias de terra, por entre clamores e silêncios
danço as danças, caminho a passo, cruzo veredas e céus
lugares de tudo o que é, de tudo o que foi,
de tudo o que será.

Repouso na quietude de um grão de Luz.
Translúcido-me...
Nada é,
nada há.

(Sentir e Ser -  2013)

terça-feira, 23 de julho de 2013

MAIO





















Incapaz
de fazer as pazes
com a falta que me fazes,
guardo rascunhos de ti
no papel da
memória.

Sinto na pele e no corpo
a brisa de Maio, de um Maio qualquer,
um tempo ido...
odor a morangos
e a flores,
a terra molhada.

No teu sorriso gargalhado,
a surpresa do último dia... 31.
Trinta e um de Maio...
Saltito feliz e contida... feliz, mas contida.
Feliz...

O gosto acre
das azedas que nascem em toda a parte,
confunde-se com o sal
da falta que me fazes.

O teu Amor
acolho-o no meu Ser
e em lembranças presentes,
abrigadas nas palavras e gestos,
roubadas ao esquecimento.
(Sentir e Ser -  2013)

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

MEMÓRIAS DO FIM

Às vezes vislumbro o fim,
repentino,
súbito!
Não é mas parece,
o fim de uma comédia.

Acabo-me!
Num sorriso imperceptivel.

(Sentir e Ser - 2012)

INDAGADOR DO NADA

Se nada há,
o que há?
Deixa de haver,
tudo
se
esfuma.
Ficamos num chão sem chão,
numa vertigem sem vertigem,
num aqui
que
não há...

Por aqui danço, danço no abismo,
se abismo há e se há dança,
outras falas, tons e sons
principiam.
E deles nascem
coisas...
que talvez não sejam nada!

Respiro o que não há,
num espaço onde hei ou não,
de existir,
nos múltiplos mins e eus
que sou
ou não!

(Sentir e Ser - 2012)


DE SÚBITO...

Entrei,
abrupta na vida,
tão brusca
quanto deixei a minha morte.

(Sentir e Ser - 2012)



segunda-feira, 10 de outubro de 2011

DO OUTONO... ainda

Outono.
Pisamos o Verão,
caduco,
em tapetes de sol
cerzidos.

Trilhamos,
na claridade
quieta
odores de terra,
húmus
chuviscado.

Silêncio
que vem,
sem quem o oiça,
trazendo o crepúsculo
sustem-se,
convoca as brumas,
asperge de orvalho
a luz
de amanhã.

(Sentir e Ser - 2011)

terça-feira, 20 de setembro de 2011

SEM TÍTULO

Serei,
pássaro negro,
esvoaçante,
contra o azul
profundo,
de um céu
intenso...

(Sentir e Ser - 2011)

DO OUTONO

Cantam as árvores
despidas de vento;
nas asas das aves
voa
para longe
o
Estio.
As folhas
adormecem a terra.
Tíbio, o Sol
caduca o Verão.
Brando o calor,
no Outono tinto
colhido em cachos.
No vagaroso impregnar,
o áureo odor,
silencia.
No leito de Morpheu,
suspende a vida.
Ainda demora
que a Terra expire.

(Sentir e Ser - 2011)

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

REENCONTRO

Mergulhamos no fundo de nós,
reencontramos a Luz.
Somos infinitos, livres, eternos,
no mergulho que de voo se reveste.
Unidos no Amor compassivo e livre,
somos Um com o Todo e regressamos...
despojados de conceitos e palavras duais.
Apenas o sentir...
Entregamos em contentamento o que recebemos,
não nos pertence.
É o Sublime, que nesta limitada forma,
nos silencia e inunda de quietude o coração.

(Sentir e Ser - 2011)

quarta-feira, 8 de junho de 2011

ENTREGA

Olha-me,
olha-me longamente.
Profundamente.
Quero ver os teus olhos,
paz e brilhos de sol.
Segreda-me
palavras de Luz.
Abraço-te,
abraço-te para sempre
num abraço diluído.
Quero em ti me confundir e fluir
num tempo sem pressa.
Quero escutar os teus pensamentos
e pensar-te os meus.
Quero percorrer a noite
abraçada nos teus abraços,
partir à deriva no Céu e juntos
trazermos nos corpos,
a Luz do amanhecer.
Quero o mágico toque do Amor,
Verdadeiro e Livre.
Quero que depois de ditas e sibiladas
todas as palavras,
na plenitude de todos os gestos,
sejamos apenas nós
caminhantes descalços e livres,
unos na longa via do Amor.

(Sentir e Ser - 2011)

SÊ PRIMAVERA

Vai! Sai! Encontra e saúda a Primavera,
entrega-te e descobre o teu coração,
embriaga-te da doçura terna
do cheiro da água,
do verde e das cores
que explodem em mil tons.

Embriaga-te de Vida,
ainda que seja,
pela
última
vez.

(Sentir e Ser - 2011)

TEMPOS DE IR

Outras Noites,
outros Tempos,
te seguirão.
Nada temas,
pensa com os teus sonhos.
Não procures arduamente
as respostas.
Todas as questões irão pairar,
e voar para longe.
Vê o Sol, começa um novo dia,
num país longínquo,
que não conhece o medo.
Fica comigo, em todos os sonhos.
Não receies, segura a minha mão,
voa comigo, ao meu lado,
esperarei por ti, sempre.

(Sentir e Ser - 2011)

quinta-feira, 19 de maio de 2011

PRIMEIRO ABRAÇO

Livre, livre, livre, livre,
livre o Amor,
após o primeiro abraço.
Seremos nós tudo?
Diz com os teus olhos,
o que sentes.
Diz com os teus olhos,
no silêncio,
o que se completa no teu coração.

(Sentir e Ser - 2011)

quarta-feira, 30 de março de 2011

SERES TERRA - Ode a uma Terra longínqua

Pequeno, pálido, um ponto azul...
Derivas só, numa via de poeiras.
Longe do centro, dizem-te em órbita,
no braço exterior de uma imensa espiral.

Não sei se cabes na palma da mão da Ilusão,
tu e a espiral e todas as poeiras,
exóticos e cintilantes faróis,
desta vastidão de negro.

Não sei se cabes na explicação da Razão,
tu e todos os cenários e acções,
evoluções e extinções,
deste vastíssimo vazio.

Palco sagrado, de Vida exaltante,
oceanos de brancos véus te cruzam,
cascatas vaporosas de chuvas evaporadas.
Líquido e azul preenche e ondula,
corre e atravessa ancestrais cicatrizes,
memórias de um anoso nascimento.

Gigante palco, de vida fulgurante. Sagrado!
Vestes verdes majestosos e dourados ardentes.
És corredor de todas as existências,
jardim de milhões de cores e odores
abundas de alma e ânimo de vida que flui.

Nos tempos idos, ficou a tua paisagem,
encerrados os Ciclos e as Eras.

Talvez, passadas Eras de vermelho te tingires,
inflamada e fundida na estrela que te ilumina,
sejas fugaz e refulgente recordação
em remotos universos.
Quiçá, ecos de ti ressurjam.

Num assomo de ousadia, qual navegador
num mar desconhecido, lançámos-te,
Terras de ti, além-espaço.

Náufragos errantes,
sonhámos quem nos salvasse da solidão!
Numa pioneira e complexa garrafa,
encerrámos a nossa chave.

Quão longe, quão distante no tempo?

Contornos esfumados de um mapa perdido,
fantasmas de seres cravados na eternidade,
vozes e lamentos de uma humanidade perdida.
Ecos e canções de uma Terra longínqua,
passada e em cinzas talvez dispersada.

Encerrados os Ciclos e as Eras,
perdida em tempos idos, ficou a tua paisagem
e os Seres, que de Vida, te sacralizaram!

(Sentir e Ser - 2011)