segunda-feira, 10 de outubro de 2011

DO OUTONO... ainda

Outono.
Pisamos o Verão,
caduco,
em tapetes de sol
cerzidos.

Trilhamos,
na claridade
quieta
odores de terra,
húmus
chuviscado.

Silêncio
que vem,
sem quem o oiça,
trazendo o crepúsculo
sustem-se,
convoca as brumas,
asperge de orvalho
a luz
de amanhã.

(Sentir e Ser - 2011)

terça-feira, 20 de setembro de 2011

SEM TÍTULO

Serei,
pássaro negro,
esvoaçante,
contra o azul
profundo,
de um céu
intenso...

(Sentir e Ser - 2011)

DO OUTONO

Cantam as árvores
despidas de vento;
nas asas das aves
voa
para longe
o
Estio.
As folhas
adormecem a terra.
Tíbio, o Sol
caduca o Verão.
Brando o calor,
no Outono tinto
colhido em cachos.
No vagaroso impregnar,
o áureo odor,
silencia.
No leito de Morpheu,
suspende a vida.
Ainda demora
que a Terra expire.

(Sentir e Ser - 2011)

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

REENCONTRO

Mergulhamos no fundo de nós,
reencontramos a Luz.
Somos infinitos, livres, eternos,
no mergulho que de voo se reveste.
Unidos no Amor compassivo e livre,
somos Um com o Todo e regressamos...
despojados de conceitos e palavras duais.
Apenas o sentir...
Entregamos em contentamento o que recebemos,
não nos pertence.
É o Sublime, que nesta limitada forma,
nos silencia e inunda de quietude o coração.

(Sentir e Ser - 2011)

quarta-feira, 8 de junho de 2011

ENTREGA

Olha-me,
olha-me longamente.
Profundamente.
Quero ver os teus olhos,
paz e brilhos de sol.
Segreda-me
palavras de Luz.
Abraço-te,
abraço-te para sempre
num abraço diluído.
Quero em ti me confundir e fluir
num tempo sem pressa.
Quero escutar os teus pensamentos
e pensar-te os meus.
Quero percorrer a noite
abraçada nos teus abraços,
partir à deriva no Céu e juntos
trazermos nos corpos,
a Luz do amanhecer.
Quero o mágico toque do Amor,
Verdadeiro e Livre.
Quero que depois de ditas e sibiladas
todas as palavras,
na plenitude de todos os gestos,
sejamos apenas nós
caminhantes descalços e livres,
unos na longa via do Amor.

(Sentir e Ser - 2011)

SÊ PRIMAVERA

Vai! Sai! Encontra e saúda a Primavera,
entrega-te e descobre o teu coração,
embriaga-te da doçura terna
do cheiro da água,
do verde e das cores
que explodem em mil tons.

Embriaga-te de Vida,
ainda que seja,
pela
última
vez.

(Sentir e Ser - 2011)

TEMPOS DE IR

Outras Noites,
outros Tempos,
te seguirão.
Nada temas,
pensa com os teus sonhos.
Não procures arduamente
as respostas.
Todas as questões irão pairar,
e voar para longe.
Vê o Sol, começa um novo dia,
num país longínquo,
que não conhece o medo.
Fica comigo, em todos os sonhos.
Não receies, segura a minha mão,
voa comigo, ao meu lado,
esperarei por ti, sempre.

(Sentir e Ser - 2011)

quinta-feira, 19 de maio de 2011

PRIMEIRO ABRAÇO

Livre, livre, livre, livre,
livre o Amor,
após o primeiro abraço.
Seremos nós tudo?
Diz com os teus olhos,
o que sentes.
Diz com os teus olhos,
no silêncio,
o que se completa no teu coração.

(Sentir e Ser - 2011)

quarta-feira, 30 de março de 2011

SERES TERRA - Ode a uma Terra longínqua

Pequeno, pálido, um ponto azul...
Derivas só, numa via de poeiras.
Longe do centro, dizem-te em órbita,
no braço exterior de uma imensa espiral.

Não sei se cabes na palma da mão da Ilusão,
tu e a espiral e todas as poeiras,
exóticos e cintilantes faróis,
desta vastidão de negro.

Não sei se cabes na explicação da Razão,
tu e todos os cenários e acções,
evoluções e extinções,
deste vastíssimo vazio.

Palco sagrado, de Vida exaltante,
oceanos de brancos véus te cruzam,
cascatas vaporosas de chuvas evaporadas.
Líquido e azul preenche e ondula,
corre e atravessa ancestrais cicatrizes,
memórias de um anoso nascimento.

Gigante palco, de vida fulgurante. Sagrado!
Vestes verdes majestosos e dourados ardentes.
És corredor de todas as existências,
jardim de milhões de cores e odores
abundas de alma e ânimo de vida que flui.

Nos tempos idos, ficou a tua paisagem,
encerrados os Ciclos e as Eras.

Talvez, passadas Eras de vermelho te tingires,
inflamada e fundida na estrela que te ilumina,
sejas fugaz e refulgente recordação
em remotos universos.
Quiçá, ecos de ti ressurjam.

Num assomo de ousadia, qual navegador
num mar desconhecido, lançámos-te,
Terras de ti, além-espaço.

Náufragos errantes,
sonhámos quem nos salvasse da solidão!
Numa pioneira e complexa garrafa,
encerrámos a nossa chave.

Quão longe, quão distante no tempo?

Contornos esfumados de um mapa perdido,
fantasmas de seres cravados na eternidade,
vozes e lamentos de uma humanidade perdida.
Ecos e canções de uma Terra longínqua,
passada e em cinzas talvez dispersada.

Encerrados os Ciclos e as Eras,
perdida em tempos idos, ficou a tua paisagem
e os Seres, que de Vida, te sacralizaram!

(Sentir e Ser - 2011)

DEMANDA

Demorada é a Noite
em que perdida demando
um fragmento de Luz, um farol.
Num corpo que ecoa,
de tudo o que me flui e confunde,
nas mãos que te sentem e percorrem,
sou tantas vezes brisa e mar,
cristalina gota de água salpicada,
sal e sol,
árvore e ave, folha seca e chuva,
pedra ou cor
do que vislumbras e julgas ver.

Na busca da Luz,
assumo a vastidão,
encontro a Eternidade.

Nunca morri, nunca nasci.

(Sentir e Ser - 2011)

ECOS (sem título)

Quando avistas um pássaro,
esvoaçante no azul,
qual dos dois voa mais alto?
_______________________________

Nunca compreenderás,
os sonhos que ficaram para trás.
________________________________

Nada do que digo,
vale a pena ser lido.
________________________________

Parei,
parei tanto,
que raízes criei
e Árvore me tornei.

FLORIR

Vou-me vestir de Árvore,
e de súbito, explodir em flores!

FUSÃO EM CORES


Vou abraçar uma tela em branco
e nela me diluir,
em milhares de cores,
primárias e invisíveis.

Encontra-me!

ENTARDECER

Deviam proibir as andorinhas,
que me trazem passados de Verão.
Deviam proibir as andorinhas,
que me evocam véus dourados de entardecer
e me cruzam de dor o coração.

Deviam proibir os seus aguçados gritos,
que me ecoam palavras entardecidas,
brisas tépidas de pálidas estrelas lavradas
e trazem cheiros de terras idas.

Deviam proibir os seus voos,
que desenham colinas de searas selvagens,
pintam anil no céu que escurece.

De voos embriagados,
trazem a promessa de um dia novo,
lembram que se estende o oceano mar,
para lá do horizonte...

No corrupio das suas últimas partidas,
chamam por mim e recordam-me,
abruptamente,
que de um sonho inesperado despertei,
que como elas não voo com o crepúsculo,
não me banho do ar dourado do anoitecer.

Com elas, não transponho a vastidão dos mares para além do sol!

Deviam proibir as andorinhas, que me lembram a liberdade...
Deviam proibir as lágrimas, que me rolam pelo rosto...
Deviam proibir que fossemos roubados à eternidade!

(Sentir e Ser - 2011)

IN EXISTIR


Correr,
correr sem impedimento,
fustigada pelo ar,
sufocada pelo vento.

Espraiar os braços;
deste corpo abandonar-me!
E partir...

Desvendar horizontes sem fim,
diluídos na ilusão.
Ir mais além,
encontrar
e saciar,
nas fontes que jorram,
a sede que me consome.
Encontrar O que não morre,
porque nunca existiu,
em fusão no Todo,
ser uno no nada
e de nada e tudo
inexistir.

SILÊNCIOS DE LUZ


Diz-me, diz-me no instante
o que te percorre!
Diz-me de repente
o que sentes!

Diz-me o que te esmaga
o que te sufoca,
o que te emudece
o que te enraivece
diz-me,
sim diz-me!

Diz-me sem medo
sem hesitação e sem murmúrio,
num grito bradado
e nunca velado, sonhado ou emudecido.

Não cales,
não me cales a vontade de saber!
Não me impeças de conhecer a
essência da tua dor,
a clareza do teu contentamento.

A não ser,
que se assome o som,
o timbre de silêncio que escutas,
luminoso e brilhante no fundo de ti...
A não ser que te encontres
naquele que não tem nome,
naquele que tudo extingue.

terça-feira, 29 de março de 2011

VOOS


No encantamento da Luz,
continuo a partir
com as andorinhas,
todos os finais de Verão.

ESPELHO


O que Eu sou,
não está contido neste corpo.
O que Eu penso,
não é parte da minha mente.
O que Eu sinto,
não está no meu coração.
O que Eu escrevo,
não se vê.
O que busco, o que anseio,
não me encontro e não me existe.
O que Eu sou,
não sou eu.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

ARVOREAR


Corro e percorro-te,
sufoca-me como punhais,
o gélido da noite.
Impele-me o vento
floresta adentro.

Vestes perdidas,
descalça, no castanho
que se entranha
num chão de folhas
em tapete tecido, escuto.

Distante um nome de terra,
esquecido.
Apelo que vocifera e explode no peito,
coração que já não bate,
dispersado, dissipado,
diluído, no rio que me flui.

Abrem-se as entranhas da terra,
largos veios à minha passagem,
longos os dedos em raízes tornados.
Um sopro sufocado, o ar que me abraça,
oferenda-me a Luz
que é meu alimento.
Ramos de braços feitos,
prolongam-se e beijam a Lua
as estrelas dançam-me segredos de vento.
Dialectos de folhas murmuram-se,
em meu redor.

Evoco tudo isto,
Acedo ao que já fui.
Amanhã, virei fazer um ninho em meus ramos.
Sou quase eterna!

(Sentir e Ser - 2011)

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Finais de Fevereiro... vislumbre de Primavera


O Inverno, de Sol disfarçado,
ilude com cheiros primaveris;
o Vento, também convidado
não se fez rogado e dança neste baile feliz.

Acompanha-o a Brisa suave,
com grinaldas e flores enfeitada,
veio a orquestra dos pássaros,
de trovas e canção afinada.

Véus de nuvens o azul desfiam,
no céu dourado o entardecer,
mais longos os dias anunciam,
a Primavera é lesta a aparecer.

Primavera Rainha que chegas,
ainda que um pouco adiantada,
às árvores prendas entregas,
numa Festa por ti orquestrada.

Saúdam-te todos os seres,
e embora de chuva disfarçada,
espalhas amores e quereres
e odores de terra molhada.

És gloriosa oh Primavera,
Rainha de todas as estações,
quando despertas as folhas,
inflamas ledos corações.

És a maestrina da Vida,
fazes obras-primas com cores,
em breve o Amor se convida,
de beijos sob as tuas flores.

(Sentir e Ser - 2011)

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

EFÉMERO


Não viverei!
Não viverei que chegue
para amar,
tudo
o que há para amar.

Não viverei que chegue
para abraçar
tudo
o que contém um abraço.

Não viverei que chegue
para cheirar,
para rir e chorar,
para recordar...
tanto
que há para lembrar.

Não viverei para aprender
a língua dos pássaros,
o dialecto das árvores,
ou voar num dente-de-leão.

Não, não me chega o tempo,
para saber o gosto da luz do Sol,
entender o murmúrio do vento,
e a cantiga que traz a chuva.

Não viverei,
para saber de que
cor é o Branco.

Não viverei o tempo,
para chegar a entender
toda a Sabedoria do mundo,
escutar as palavras,
sons e melodias.

Levaram de mim a Eternidade,
sem meu consentimento,
fiquei nas mãos do Tempo!

Para trás, o negro,
e nos dedos,
o pó
que sobra das oferendas da Vida.

Não viverei, mas encurto os passos,
num caminho tecido de vagar,
para que caibam em mim
o Amor e os abraços,
o riso e as lágrimas,
as lembranças e memórias
as cores e os sabores,
os sons e os odores...
da sabedoria do meu mundo.

Não, não viverei...
e
não te concedo tréguas!

(Sentir e Ser - 2011)

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

FUTURO


Um Ícaro de papel vou erguer à Lua,
enquanto baleias voadoras e mantas planadoras
vagueiam sob o céu violeta.

Vou ver seres, homens e mulheres,
que hibernam pacientes.
Aguardam pensamentos de cristal,
para irem envergar,
asas de cores translúcidas.

Ocultas no mar sereno,
brincam medusas de água,
brilham os sonhos de crianças,
com risos de gaivota.
E os cavalos-marinhos,
trazem melopeias
para dançar com as anémonas.

Véus de esmeralda gentis,
encobrem delicados girassóis,
que nascem,
em busca do Amarelo.

Vou soprar grãos de areia
e germinar estrelas do mar.

A canção dos golfinhos
dirá palavras do futuro,
memórias do que poderia ter sido.

Vou agarrar sóis radiantes com as minhas mãos,
e semeá-los numa terra azul.

Tudo isto eu verei,
tudo isto farei.

(Sentir e Ser - 2011)

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

METAMORFOSEAR


Vou partir
e me diluir,
quiçá
transmutar
em
espuma do mar.







(Sentir e Ser - 2011)

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

CÁRCERE

Quem ousou aprisionar-me
neste túmulo?
Quem roubou a minha liberdade?
Não mais, o voo nas asas do Pássaro Invisível,
não sopro com o vento num céu despido de Inverno.
Deixei de me confundir na luz,
braços não tenho para abraçar o ar,
outros mundos não percorro,
presa,
neste excrucitante corpo.

Caminho contudo,
no desalento.
Desespero, numa onírica visão
sem fronteiras.
Desperto, num agonizante grito de dor.

Liberdade, brado eu!
Morte, sussuram eles...

Afasto as cortinas, eis que flui luz.

(Sentir e Ser - 2011)

SER

SER LIVRE!
SER
SELVAGEM!
NÃO ME RALO,
NÃO ME

INTERESSA,
SE ME
PERDER...


(Sentir e Ser - 2011)
Verás o Sol,
ainda que te cegue
o nevoeiro.


(Sentir e Ser - 2011)
NÃO EXISTO!
SOU ILUSÃO.
A TUA!


(Sentir e Ser - 2011)

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

HOJE (parte II)

Hoje acordei no verbo não.
Hoje não gosto de vegetais,
não quero saber dos animais!
Hoje não sou contra o roubo nos salários,
não sou contra os prémios milionários!
Hoje não condeno o rico ilícito,
o esbanjamento ou desperdício!
Hoje, não me indigno com a fuga ao fisco,
com os carros nas garagens abastadas,
ou com as contas recheadas!
Hoje, não digo não à corrupção,
aos milhões que se lavam com as mãos!
Hoje, não sou contra a tourada,
não me choca a massa humana,
esfomeada!
Hoje não reparo na Ignorância,
nos maus tratos na infância!
Hoje não penso na surdez e na rudeza,
com que abatem a Natureza!
Hoje não escuto os apelos e os clamores,
de quem sofre de várias dores!
Hoje não me revolto, não protesto!
Hoje não me indigno!
Hoje não choro!
Hoje não! Amanhã? Não sei, logo se vê.
Ou não!

(Sentir e Ser - 2011)

ARagem


Serei feliz,
quando mais não for que brisa,
e correr o mundo,
levar comigo os pássaros
e os seus cantos,
receber das árvores, afagos,
sem demora,
nos seus longos e anosos ramos.
Levarei comigo pequenos seres,
vozes e memórias de outrora,
a água ou o fogo
as tristezas e alegrias,
fugidias.
Visitarei o oceano,
mar,
as escarpas rochosas,
onde não me deterei
mais do que um momento,
e um qualquer recanto,
onde se escondem
as silenciosas folhas do Outono.

Ainda assim, darás por mim.

(Sentir e Ser - 2010)

PULSAR


Persiste em mim o rasgo
do Infinito, desde que me concebo.
Pulsante, teimosamente irrompe
quaisquer limites.
Abarco-o, é parte de mim,
este Infinito que pulsa,
nas fronteiras do meu corpo,
exíguo...
Libertá-lo, expandi-lo...
Ei-la, a razão da minha dor!

Doem, aguçados gumes,
refulgentes de luz,
digladiam e retalham
as máscaras que não me servem.
Não! Não,
jamais me couberam!
Por isso pesam...
Carrego-as, ofusco essa luz,
inextinguível.
Fardo de dor. Dor...que me dilacera.
Disfarces cerzidos, por mim,
e em mim remendados,
à força.
Sem nomes nem palavras,
experimento a fusão no êxtase e deslumbramento,
se me permito e acedo a um vislumbre,
do Infinito...
e verto pelo caminho, lágrimas...
também de sofrimento. Grilhões!
Cresci, quase persuadida,
perto de ser confundida,
com a minha loucura interior.
Mas sei que não estou,
sei que não sou!
Louca!
Mas apenas
VIVA.

Em redor do Sol, brilha o silêncio, Infinito.

(Sentir e Ser - 2011)

SOLIDÃO

Escrevo-me
para que não cesse a minha existência,
para não me esquecer de existir.
Escrevo-te para me lembrar, sempre,
que partiste,
que exististe, e comigo caminhaste
neste meu
intervalo do Caminho.

(Sentir e Ser - 2010)

ENTRA


Vou abrir-te os portões do meu jardim.
A ferro bordados, de pontos, vírgulas e espaços.
Vais caminhar de silêncio;
abrem-se à tua passagem
as brumas da solidão.

Pisas terra fértil de dúvida e interrogação.
Flores, muitas, pálidas e garridas,
pétalas espalhadas, borboletas de sorrisos,
pássaros com trovas de alegria.

Há pedras, que arrumadas, orlam canteiros,
vazios.
Lágrimas de seixos, dispersas no caminho,
pelo vento sufocante do Inverno.
Tem cuidado, não te magoes!

Trouxe areia do mar, e um cheiro de Verão,
estão acolá.
Também por aqui passam as andorinhas,
ébrias de sol. Cruzam o céu com cantos de anil.

A Primavera floriu as sementes, e fez crescer ervas;
as daninhas arranco-as, em dias brancos de chuva.

Por aqui não passam as Estações,
passam os Tempos, todos!
Deixaram o cheiro do verde
e dos abraços castanhos à terra.

Se olhares com atenção,
verás ao fundo a Floresta sem muros,
as árvores, gigantes, dançam com o Outono
douradas melodias.

Entoações antigas, notas de um piano irrequietas,
pontilham o ar, não sei de onde vêem!
Nas pausas da quietude, cessa de caminhar.

Escuta.

Talvez encontres a Árvore da Sabedoria.
Não sei onde está.
Disseram-me os pássaros que se perdeu na Floresta.
Se a vires, repousa na sombra da sua Luz.
Recolhe nas tuas mãos o orvalho das suas folhas,
para um dia sem Sol.

Quando partires, leva silêncio.
Leva na memória o cheiro das cores.
Fecha o portão.


(Sentir e Ser - 2011)

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

21

21
No dia de hoje, partiste. Um ano, ou ontem?
Serenei em mim as lágrimas que já não sei chorar.
Teimo em não recordar, recuso o sentir, a minha saudade.
Não vais voltar, só nos meus sonhos.
É aí, nesse espaço,
nesse tempo, que escuto,
Sábias palavras.
Nesse tempo, eu deito a minha cabeça no teu colo,
escuto o teu respirar, sinto o teu afagar.
Nesse tempo, escuto a tua voz, em muitos tons,
quando chamas o cão, "anda, anda comer"
ou a galinha,"piu piu piu",
que morreu de velha.
Quando falas à terra, às árvores,
quando me olhas e perguntas o que quero almoçar.
Caminhas, devagar, tão devagar.
O cágado de estimação fugiu pelo quintal, para outras paragens talvez.
Sorrio quando te vejo caminhar, o som dos teus passos.
Apetece-me sopa de tomate à alentejana, só com tomate e ovo, não quero pão...
Tem um sabor diferente, neste prato estalado e velho. Tem a tua mão, o teu tempero.
Aprendi contigo o arroz doce, sempre muito doce.
Amargo,um amargo,
no fundo de mim,
uma dor e um soluço porque perdi,
o som dos teus passos,
o branco do teu cabelo,
o calor do teu afago,
a tua voz.
Não existes já, só nos meus sonhos. E ainda no meu lembrar.

(Sentir e Ser - 2011)

HOJE

Hoje,
apetece-me ser a antítese de tudo o que defendo.
Hoje não quero ser amiga, compassiva
simpática e sorrisos.
Hoje não quero pensar, quero antes mergulhar
na indiferença
na anestesia
no conformismo.
Voltar costas ao sofrimento alheio,
à luta.
Vou deixar de acreditar,
baixar os braços,
obedecer sem questionar
e continuar a caminhar, vazia do pensar, vazia do sentir,
entrar em modo automático,
para não sofrer.
Amanhã, quem sabe, volto ao normal.

(Sentir e Ser - 2011)